Comissão de Constituição e Justiça aprova admissibilidade da proposta por 31 votos a 20 na madrugada de quinta (15)
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (15), por 31 votos a 20, o parecer do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) que defendia a constitucionalidade e a legalidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287 de 2016, que altera regras da Previdência. A discussão em torno do tema levou mais de 12 horas.
O governo teve dificuldades na aprovação: além da resistência da oposição, parlamentares da base aliada votaram a favor da admissibilidade, mas afirmaram que votarão contra certos pontos da proposta. A PEC agora será encaminhada a uma Comissão Especial, a ser criada, que terá como objetivo discutir o mérito do projeto.
Estampada na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, a reforma da Previdência prevê, entre outras coisas: aumento de 15 para 25 anos do tempo mínimo de contribuição; idade mínima de 65 anos para requerer o benefício; e tempo mínimo de 49 anos de contribuição para receber integralmente a média dos salários que o trabalhador recebeu ao longo da vida.
Debate
A bancada governista conseguiu emplacar o início da discussão da medida no período da tarde e fechou um acordo com os opositores para que a matéria fosse votada ainda na quarta (14). Os debates tiveram início às 15h.
Sufocada pela hegemonia governista, a oposição aceitou a proposta, sob a condição de que a comissão para avaliar a matéria será instalada somente em fevereiro, após a eleição do novo presidente da Casa e da nova composição da mesa diretora. O acordo foi selado por intermédio do líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE).
Em uma sessão marcada por gritos e intensa troca de farpas, os parlamentares se revezaram entre críticas e elogios à proposta, que vem sendo apontada como a mais polêmica do Planalto.
A avaliação dos opositores é de que, envolvido em escândalos e denúncias provenientes de delações, Temer deve encontrar mais dificuldades para acelerar a tramitação da PEC do que tem tido nas outras medidas de austeridade.
Além disso, eventuais fissuras na base aliada tendem a fortalecer o coro contra a medida, que ganhou a antipatia de membros de algumas legendas governistas, como o PSB. A sigla tem criticado a celeridade da matéria, que teve parecer favorável antecipado pelo relator no último dia 8, menos de 24 horas depois de ter chegado à Câmara.
“Vamos manter nossa linha de que essa matéria não pode ser votada com este açodamento que se quer em 2016. É preciso debatê-la”, disse o pessebista Júlio Delgado (MG). A legenda tem quatro representantes na CCJ da Câmara.
Entre outras coisas, a oposição argumenta que a PEC 287 fere as normas constitucionais. “Estão tentando colocar a discussão da admissibilidade da proposta como se ela fosse uma discussão menor, mas não é. A Carta Magna começa falando da defesa da dignidade humana. Aliás, o princípio fundante que perpassa toda a Constituição é esse. É possível ter dignidade se uma parcela da população não terá direito a se aposentar? É possível ter dignidade se o Estado fecha os olhos para a dupla ou tripla jornada que as mulheres já enfrentam?”, questionou Érika Kokay (PT-DF), em referência à exigência de idade mínima igual para homens e mulheres.
O governista Fausto Pinato (PP-SP) argumentou que a PEC seria necessária ao país e comparou a medida a um “remédio amargo”. “O Brasil está convicto de que o governo anterior não fez os ajustes necessários à Previdência. Ou deixamos como está ou temos que cortar na própria carne. É um remédio amargo, porém necessário para salvar a Previdência”, disse.
O líder da Rede na Casa, Alessandro Molon (RJ), classificou os pontos da PEC como “aberrações”, em especial o de aumentar para 25 anos o tempo mínimo de contribuição. “A maioria absoluta das aposentadorias no Brasil se baseia no critério de idade, e não de tempo de serviço. Há pessoas que não conseguem comprovar mais do que 20 anos de contribuição. A elevação do tempo vai deixar sem previdência milhões de brasileiros, os pobres, que são os que mais trabalham na informalidade”, destacou Molon.
Ele também fez um paralelo com as regras verificadas em outros países. “Na Europa, o tempo mínimo oscila de 10 a 20 anos. No Brasil, um país com muito mais deficiências, quer se colocar 25 anos”, bradou o deputado.
Já o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) questionou a legitimidade do atual governo para promover reformas profundas no país. “Este governo já acabou. Não tem legitimidade nenhuma, portanto, não tem moral, e ainda quer emplacar esta matéria, que faz o jogo do mercado financeiro”, criticou o petista. Entre outros atores, a oposição citou as empresas de previdência privada como grandes beneficiárias da reforma.
Campanha
Em discurso no colegiado, o líder do PSOL na Câmara, Ivan Valente (PSOL-RJ), reprovou a campanha de comunicação patrocinada pelo governo para emplacar a PEC 287.
“Um anúncio que foi colocado em jornais, em revistas e na televisão diz: ‘Previdência: reformar para não acabar. Se continuar como está, não haverá mais Previdência’. Em política, o nome disso é terrorismo. É disso que se trata”, criticou Valente.
O governo tem insistido que a reforma seria necessária ao equacionamento das contas e afirma que a medida traria uma economia de cerca de R$ 740 milhões na próxima década. Os oposicionistas têm combatido o discurso e argumentam que, além de penalizar o trabalhador, o arrocho é seletivo porque não se aplica ao montante que sai dos cofres públicos para pagamento da dívida pública.
“Somente no ano passado pagamos R$ 508 bilhões de juros da dívida pública, e nem estou citando as amortizações. (…) Há uma tentativa de beneficiar o setor privado para que a população pague a conta da crise. Os jovens de hoje, por exemplo, não vão mais conseguir se aposentar. É óbvio que o que estamos vendo é um atentado aos direitos dos trabalhadores”, denunciou Valente.
OAB
As críticas que circundam a reforma da Previdência envolvem também a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que tem feito ponderações em relação a determinados pontos da medida.
O presidente nacional da entidade, Cláudio Lamachia, veio ao Congresso acompanhar a sessão da CCJ nesta quarta. Em entrevista à imprensa, ele classificou a proposta como “retrocesso” e disse que a medida fere os direitos sociais garantidos pela Constituição Federal de 1988.
Lamachia também defendeu que a PEC deve ser amplamente debatida em audiências públicas. “A solidariedade que motivou o Estado a construir uma estrutura de direitos sociais previdenciários não pode ser açodadamente extirpada sem um profundo debate com a sociedade”, defendeu.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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