O confinamento de membros da mesma família durante a pandemia de covid-19 levou ao aumento de casos de violência doméstica contra mulheres. Muitas delas se culpam pelas agressões ou nem sabem que vivem num constante ciclo de violência com o ofensor. Quando reconhecem isso, poucas têm coragem de denunciar. Essas são algumas conclusões debatidas durante o painel virtual promovido na Escola Judicial do TRT da 2ª Região na última sexta-feira (18/3).
Titular da 3ª Delegacia da Mulher da Capital (oeste) em São Paulo, Dannyella Gomes Pinheiro afirma que qualquer mulher pode ser vítima da violência doméstica, não importa classe, origem ou condição social. O agressor, por sua vez, geralmente vem de um lar disfuncional, onde a violência é naturalizada. “É inaceitável a ideia de que a mulher permanece na relação violenta por gostar de apanhar. A grande dificuldade de ela se livrar daquela situação é a dependência emocional”, alerta.
Para a delegada, há diversos mecanismos legais que protegem as mulheres. Entre os exemplos que cita estão o crime de descumprimento de medidas protetivas da Lei Maria da Penha, que facilitou o pedido de prisão de ofensores, e os crimes de perseguição e violência psicológica contra a mulher, inseridos no Código Penal em 2021. Também há possibilidade de se registrar casos de violência pela internet e até aplicativos de apoio a essas vítimas, como o SOS Mulher em São Paulo.
Na opinião de Dannyella, a mulher precisa conhecer essas ferramentas e seus direitos, além de buscar apoio emocional para reagir. E, mesmo que ela não se reconheça como vítima, quem souber ou desconfiar que o delito está sendo praticado deve acionar a polícia, que irá investigar.
Após perder um bebê e ganhar peso na segunda gravidez, a servidora Deise Cristiane Freire de Souza conta que era humilhada pelo ex-marido, o qual vivia criticando o corpo dela, e até chegou a ter uma arma apontada para a cabeça. Como muitas das agredidas, tinha vergonha de si própria, se isolou da família e confessa que não sabia que passava por violência doméstica. “Nasci e fui criada num lar machista e patriarcal. Obedecíamos ou apanhavámos. Cresci com essa crença de que amor e violência andam juntos”, explica.
Ainda curando as feridas emocionais do trauma, hoje ela compartilha sua história a fim de que o ciclo de violência seja rompido. Trabalha como agente de segurança no TRT-2, onde em breve receberá novo treinamento para defesa pessoal, dessa vez com o colega de trabalho e instrutor de krav maga (arte marcial) Valdemiro Salema Cardoso.
Em suas aulas, ele ensina que objetos do dia a dia como bolsa, caneta e celular podem ajudar a salvar a vida das mulheres. E qualquer interessada, independentemente da idade, pode aprender a se defender. “Noventa por cento da situação violenta é evitada pela prevenção. Mas, em determinadas situações, a mulher vai precisar se defender. Com o treinamento, a mulher vai adquirir autoconfiança, consciência situacional e perceber o ambiente em que está inserida”, exemplifica.