Projeto de Lei 3.914/2020
O Projeto de Lei que transfere os custos das perícias médicas aos segurados é criticado em debate no Senado Federal
Caso o PL 3.914/2020 [de autoria do deputado Hiran Gonçalves (PP-RR), aprovada pela Câmara dos Deputados em 17 de agosto] seja aprovada, a despesa passará a ser integralmente do segurado que necessite de reavaliação pericial, a partir de janeiro de 2022.
Atualmente, a obrigação de custear as perícias de quem possui gratuidade da Justiça é do próprio tribunal em que o processo tramita.
Em 2019, a Lei 13.876 deu ao Poder Executivo a missão de custear essa perícia nos processos de benefício por incapacidade durante dois anos. Como a norma foi publicada em 23/09/2019, o prazo termina na próxima quinta-feira (23).
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) sugeriu que o governo apresente uma medida provisória a fim de que esse limite seja estendido pelo menos até dezembro, a fim de que os senadores consigam se alinhar. “Não se pode continuar esmagando quem gera riqueza, que é o trabalhador”.
Para Paim, a medida está fora da realidade do país, porque inibe a gratuidade para parcela significativa da população, ferindo a Constituição.
Ele considerou ainda mais grave a matéria tramitar paralelamente à execução do Programa de Revisão dos Benefícios por Incapacidade adotado pelo INSS.
Afronta a direitos
O presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB, Tiago Beck Kidricki, disse que a instituição é contrária à proposta porque a celeridade dos processos não pode passar por cima de direitos previstos na Constituição.
“Como advogado, me sinto constrangido por ter que vir aqui e explicar as fragilidades a direitos caros que estão sendo retirados. Isso é uma afronta aos direitos dos trabalhadores, e a OAB defende outras alternativas. Com esse projeto, estamos criando duas categorias de justiça gratuita. Não aprovem os jabutis porque, se não houver acordo, vamos entrar com ação.”
Texto derrubado
Já o coordenador-geral de Matérias de Benefícios do INSS, Elvis Gallera Garcia disse ser preciso celeridade no julgamento desses benefícios e, por isso, considerou importante não faltarem recursos para os peritos. Para ele, o PL 3.914/2020 é meritório ao dar ao juiz a possibilidade de estabelecer um prazo para revisão dos indeferimentos.
Paim ressaltou que essas alterações na proposta já constavam no projeto de Lei de conversão oriundo da Medida Provisória 1.045/2021, rejeitada por ampla maioria no Senado. Ele ponderou que somente matérias referentes à pandemia de coronavírus deveriam ser votadas pelo Congresso durante a decretação de calamidade pública.
— A OAB se mexeu, muita gente se mexeu no Brasil, o Senado derrubou todo o projeto, e um dos motivos principais foi esse: A MP limitava o acesso à Justiça gratuita, prejudicando aposentados, pensionistas, consumidores e trabalhadores; exigia que, nas ações previdenciárias, o beneficiário antecipasse os honorários dos peritos. E nada contra o perito; perito tem que ganhar um salário bom, sim; vai cobrar de quem tem que pagar, vai cobrar do Estado, e não do pobre trabalhador.
Urgência
O advogado-geral da União substituto Adler Anaximandro de Cruz e Alves, discordou de Paim de que a matéria não deveria ser discutida no momento em que o país enfrenta a crise sanitária devido ao coronavírus. Ele disse que o orçamento da Justiça Federal para pagar perícias judiciais nas ações previdenciárias se esgotou no exercício de 2019 e a Justiça Federal praticamente parou de funcionar. Adler afirmou que Parlamento e Judiciário chegaram a um consenso junto ao Poder Executivo naquela ocasião para reconhecer que a União, a partir de 2019 e até 2021, arcaria com o pagamento dessas despesas. E defendeu uma solução para o fato de que a partir desta segunda-feira as perícias judiciais não mais poderão ser pagas, dado o fim do ciclo previsto na Lei 13.876, de 2019.
— Propriamente nós não estamos falando de covid-19, mas se nós não endereçarmos agora no Senado uma alternativa para o pagamento das perícias judiciais, a partir de hoje, a Justiça Federal também não poderá fazê-lo, porque a Lei 13.876 extingue seus efeitos na data de hoje. Por isso a urgência e a importância de o Senado Federal contribuir com esse debate tão importante — afirmou, defendendo o projeto.
Presidente do Instituto Brasileiro de Perícia Médica (IBPM), Ana Carolina de Almeida Couto Tormes também focou o discurso na urgência da matéria. Ela disse que os peritos ficaram sem salários em 2019, levando alguns profissionais a perderem bens como casas e outros a cometerem suicídio. Segundo a debatedora, a categoria está preocupada não somente com o próprio sustento, mas com um acesso da população à Justiça pouco eficiente.
— Enquanto peritos, a gente vem aqui encarecidamente solicitar que ponderem a urgência da aprovação do PL, porque não só nós médicos ficaremos desguarnecidos e teremos nosso sustento prejudicado. Se ele não for aprovado com urgência, as perícias vão ser paralisadas, não tem jeito.
Emenda substitutiva
Para Paim, a alegação de urgência sobre o tema é uma espécie de chantagem, que se assemelha à tramitação das medidas provisórias, cujo prazo de avaliação pelo Senado é sempre curto. Ele apresentou emenda substitutiva global ao projeto de lei para assegurar que o Poder Executivo pague a perícia no processo judicial e, nos casos de acidente de trabalho, os trabalhadores sejam isentos das custas processuais e honorários. Além disso, o senador assinou requerimento para que a proposição tramite nas comissões temáticas da Casa antes da votação pelo Plenário.
O presidente da sessão temática, senador Paulo Rocha (PT-PA), disse que o debate ajudará a aperfeiçoar a legislação. Para ele, arroubos autoritários podem levar o país ao caos e, por isso, é importante debater uma solução que contemple também o interesse da sociedade.
— A gente faz valer nossa vontade através da correlação de forças. Por isso também é fundamental a pressão da sociedade sobre o Congresso Nacional a respeito de todos os seus interesses.
O relator Luis Carlos Heinze, disse que discutirá junto ao governo as manifestações apresentadas no debate, bem como as emendas dos demais senadores, numa reunião prevista para acontecer até a próxima quarta-feira (22).
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Fonte:
Por Aline Guedes